Não é desses poderes que irei falar mas sim dos poderes
imateriais que, poderemos também designar por poderes espirituais. Nesses
poderes incluo as religiões, muitas vezes, donas do pensamento e da consciência
dos cidadãos condicionando a sua mundividência; do poder da imprensa e das
instituições universitárias. A estes poderes acrescento o da língua e, correlativamente,
o da literatura sem excluir as artes plásticas, o teatro, o cinema e outras
formas de manifestação cultural e artística.
Os pilares mais robustos e fundamentais da soberania de
qualquer país são a sua história, a língua e memória a que junto a identidade e
a literatura; tudo isto bem mais importante do que o poder do dinheiro e de
todos os exércitos.
Assistimos hoje às terríveis consequências do fundamentalismo
islâmico cuja base assenta numa hermenêutica próxima da literalidade e do
enviesamento interpretativo do Corão tendo como consequência o terrorismo que
tem vindo a condicionar de forma indelével a civilização ocidental. Como vemos
é este poder imaterial a condicionar a vida de numerosas nações colocando em
causa o seu bem-estar e segurança.
Num plano benfazejo também o poder da língua e da literatura
e de todas a outras manifestações de pensamento e arte a que fiz referência são
fundamentais.
Todos sabemos dizer quem foi Sócrates, Platão e Aristóteles
mas poucos saberão as motivações da guerra do Peloponeso ou das guerras
Púnicas. Todos sabemos quem foram Miguel Ângelo, Rafael ou Leonardo da Vinci
mas, por certo, não alinharíamos de memória como se dividiam as repúblicas
italianas. Há mais cidadãos que conhecem a Gioconda do que todos os reis de
Itália.
Entre nós seremos em maior número os que conhecemos Camões,
Pessoa ou Saramago do que os que conhecem o tratado de Alcanices que definiu as
fronteiras de Portugal no século XIII ou de todos os políticos que enxameiam de
mediocridade os canais de televisão.
Daqui a cem anos ninguém saberá o nome de nenhum dos gurus
do capital financeiro, mas todos saberão, por certo, quem foi o papa Francisco
que na simplicidade das suas palavras é ouvido e amado por milhões de cidadãos
em todo o mundo.
Foi maior o legado dos filósofos gregos que continuam a ser
estudados do que o de todos os reis de Esparta, a cidade militar, ou de Atenas.
O mesmo sucede com os poderes da investigação científica. O
mundo viveria muito mal sem os antibióticos como também não seria o mesmo se
não tivesse chegado até nós a Odisseia de Homero, a Poética de Aristóteles ou a
República de Platão.
Afinal, são os poderes imateriais o grande sustentáculo das
mudanças. O mundo não muda por decreto mas antes pelo poder das ideias.
