Por: Tânia Santos
A
contemplação mental da Arquitectura:
Igreja
da Sagrada Família
O edifício não foi propriamente bem
recebido pelo público. A relação que o observador estabelece com determinada obra
baseia-se, geralmente, numa “primeira impressão” que o aspecto exterior lhe suscita.
Por isso, penso que, ao projectar o edifício, o arquitecto estava já consciente
do impacto controverso que este iria causar. Sobretudo, quando opta pelos tons
de cinza escuro do betão aparente, que contrastam com o branco e as cores vivas
que revestem os edifícios de habitação adjacentes. A exploração do contraste
material é uma paradigma que se coloca na arquitectura contemporânea. Neste
caso, mais do que qualificar a ligação da obra com a envolvente, julgo que a
escolha material enriquece o sentido escultórico do objecto.
Por outro lado, o lugar de implantação da
igreja, posicionado numa área fundamentalmente residencial, sempre me pareceu questionável. Prevalece a
sensação que a obra se esconde entre os edifícios de habitação que a envolvem. Neste
caso particular, não é a dimensão do volume da igreja que incomoda, mas antes a
proporção espacial que conforma toda a área envolvente. O terreno destinado ao
projecto, na verdade, englobava parte da área, entretanto ocupada pelas
habitações da Urbanização Varandas do Tâmega. Efectivamente, sente-se que o
equipamento público necessitaria desse espaço (vazio) para respirar e assim se integrar
naquela urbanização.
Apesar das perturbações do lugar de
implantação, o arquitecto aproveita as interessantes perspectivas visuais que o
terreno estabelece com a paisagem. Se observarmos o edifício a partir da
varanda exterior, que se configura na cota superior do terreno, é possível
espreitar as aldeias acidentadas que conformam a região. Um autêntico quadro pintado
pelo próprio arquitecto, com o objecto em primeiro plano e a paisagem a cobrir
o plano de fundo.
Convido então o observador a entrar na igreja. Saliento o cuidadoso tratamento de luz que o espaço recebe. Na escuridão do interior, distingue-se a luminosidade do espaço do presbitério, que enfatiza o seu aspecto simbólico. Este efeito é conseguido através da entrada de luz por um grande janelão, orientado a noroeste. Finalmente, ao entrar, esta luz é reflectida pela parede lateral superior para o piso inferior, onde se situa o presbitério. Por sua vez, o espaço litúrgico recebe uma iluminação directa, mais difusa, que provém das aberturas laterais. Esses vitrais, desenhados pelo artista plástico Francisco Laranjo, recriam um jogo de composições geométricas. Apesar da sua linguagem contemporânea, os envidraçados conservam a qualidade de reforçar a atmosfera de recolhimento do espaço, ou seja, são aplicados com a mesma função que desempenham nas igrejas tradicionais.
Por fim, uma nota para o emprego dos
materiais. O betão aparente das paredes, que expressa toda a “verdade
estrutural” do edifício, é combinado com a madeira empregue na cobertura, no
pavimento e nalgumas carpintarias, como bancos e portas. Excepcionalmente, para
novamente ressaltar a importância do presbitério, o cenário é materializado em
mármore.
Quando contemplei pela primeira vez o
espaço interior desta igreja, senti-me imediatamente envolvida pela
arquitectura. Despontaram-me à cabeça conceitos como meditação, reflexão,
silêncio ou refúgio, próprios da essência do espaço religioso. Provavelmente, é
esta simbólica “primeira impressão” que fomenta o meu encanto pela obra.







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