A história termal da cidade de Chaves ganha novos contornos com a descoberta do balneário romano. A imensidão do achado foi desvendada aos poucos, à medida que as distintas fases de escavação prosseguiam. Nove anos depois o projeto ainda não está concluído, mas a expectativa mantém-se alta.
Em 2006, a propósito da construção de um parque de estacionamento subterrâneo no Largo do Arrabalde em Chaves, escavações arqueológicas permitiram descobrir aquele que outrora foi um balneário termal romano, que atraía inúmeras pessoas na ânsia de curarem doenças específicas. Entre 2006 e 2008 foi escavada a área central do monumento romano, havendo uma interrupção até 2012 para financiamento da obra. As escavações retomam nesse ano, tendo terminado em 2014, aquando da descoberta total do balneário termal.
Sérgio Carneiro, arqueólogo e diretor científico dos trabalhos envolvidos nesta descoberta, realça a necessidade de ser feita a distinção entre termas higiénicas – destinadas aos hábitos de higiene dos moradores – e as termas terapêuticas – às quais as pessoas acorriam com o intuito de curarem as suas doenças. O balneário descoberto corresponde efetivamente a esta última categoria, o que nos permite ter uma percepção da importância para o circuito termal do império romano. Por outro lado, a nível arquitectónico, este tipo de construção era concebida em função dos tratamentos e das próprias nascentes de água termal, distinguindo-se do esquema rígido a que os balneários higiénicos eram sujeitos.
A descoberta corresponde a três piscinas de diferentes tamanhos e com diferentes funções, quatro salas (sendo que uma delas trata-se de uma enorme área pavimentada) e um sistema de regulação da própria água. Uma obra construída entre o século I (transição da era) e o século III. Sérgio Carneiro realça a qualidade e a importância da construção, bem como o facto de o balneário ter sido encontrado num excelente estado de conservação: “todo o sistema de abastecimento de água às piscinas e de escoamento de águas está a funcionar. As piscinas estão muito bem conservadas e perfeitamente estanques e com parte ainda do revestimento interno”.
A curiosidade da comunidade científica
Um achado desta proporção não cria apenas curiosidade na cidade. Apresentado em distintos congressos, o balneário termal de Chaves tem despertado imenso interesse por parte da comunidade científica. Sérgio Carneiro explica que o bom estado de conservação do monumento provém do desabamento da abóboda de cobertura do edifício, derivado a um tremor de terra ocorrido no final do século IV. A lama e o estancamento das águas permitiu conservar distintos materiais que, noutras condições, ficariam deteriorados. “Temos peças de metal, madeira e osso num estado de conservação ótimo, o que vai enriquecer imenso o museu”, afirma Sérgio Carneiro, “uma coleção enorme de fauna que encontrámos nas condutas e nas piscinas e que nos dão uma informação muito importante para este período em relação à alimentação”. Por outro lado as madeiras encontradas trouxeram novas informações sobre o coberto florestal em torno da cidade.
O arqueólogo destaca ainda o facto destas escavações não se terem reduzido ao período romano, pois a estratigrafia permitiu encontrar novos elementos para a história da cidade. As informações encontradas ao longo dos anos limitam-se aos séculos XVII/XVIII e ao período romano, havendo uma lacuna relativamente ao período medieval da cidade de Chaves. Com a descoberta do balneário termal foi também identificada “estratigrafia medieval que nos dá informações riquíssimas em relação à organização da cidade”.
Museu termal: a abertura
Apesar do projeto da estrutura exterior do balneário já estar praticamente concluído, há muito ainda para fazer. O orçamento inicialmente previsto foi alargado devido às soluções arquitectónicas que tiveram de ser encontradas, dado o facto de não ser possível colocar pilares dentro do museu. A solução passou por colocar vigas de grande proporção, o que tornou o projeto mais caro.
Sem previsão para a abertura do futuro museu termal ao público, Sérgio Carneiro revela que será lançado um concurso público em janeiro de 2016, de modo a poder ser concluído o interior da obra e proceder-se à musealização - “será um concurso de ideias para a construção e musealização, mas também terá a componente de estratégia, de comunicação, marketing e de criação de uma marca; tudo isso será incluído no projeto”, informa Sérgio Carneiro. Tratar-se-á de um concurso para uma equipa multidisciplinar, ao qual poderá concorrer qualquer pessoa, e que será avaliado por um júri especializado.
A opção da equipa de trabalho tem passado pela divulgação através de investigação científica, com a participação em congressos internacionais, onde é divulgado o sítio arqueológico. Sérgio Carneiro não tem dúvidas: o balneário termal descoberto no Largo do Arrabalde em Chaves “está a despoletar a expectativa face ao museu e certamente contribuirá muito para a atração de turistas”. O balneário termal é considerado, desde dezembro de 2012, Monumento Nacional. Pretende-se que, dentro de uns anos, atinja o estatuto de Património Mundial da UNESCO.
Sem comentários :
Enviar um comentário