“O betão é o melhor amigo do homem a seguir ao cão” | Escola Secundária Dr. Júlio Martins


Por: Tânia Santos





O projeto de renovação e ampliação da Escola Secundária Dr. Júlio Martins, decorrido de 2009 a 2012, integra-se no âmbito do Parque Escolar, focado na modernização das escolas de Portugal. De notar que o projeto original conta com a assinatura de um influente arquiteto português, Januário Godinho (1910-1990), responsável por algumas das obras públicas instituídas pelo governo de Salazar.








Vulgarmente também conhecida pela “Técnica”, a Escola de Chaves apresenta um modelo arquitectónico típico das escolas “industriais” dos anos 50. Penso que foi neste aspecto que o arquiteto Nuno Brandão Costa se inspirou na concepção do projeto contemporâneo: uma escola que, portadora de uma linguagem moderna (no sentido contemporâneo), enfatizasse a história da sua génese. E isso explica a razão de não esconder as enormes infraestruturas necessárias. Antes pelo contrário: usa o carácter expressivo desta “maquinaria” para a trabalhar como objecto escultórico, expondo o betão sem inibir a escuridão das tonalidades que o caracterizam.

Estamos agora perante uma obra que se desdobra em dois tempos e que distingue os elementos do passado e do presente, fomentada pelo princípio arquitectónico, que parte do contraste para depois alcançar a analogia. Uma escola que situo entre dois mundos - o antigo e o novo -, que coexistem em harmonia.

Talvez não seja a pessoa mais indicada para comentar um projeto desenhado por um arquiteto que foi meu docente académico da cadeira de Projeto. Contudo, o que está em questão é a qualidade da obra e não do arquiteto (que é apenas um dos responsáveis entre muitos). Por isso, do mesmo modo que reconheço a qualidade da obra, também lhe aponto falhas.

Quem conhece a “Técnica” sabe que uma das lacunas se prendia com a falta de espaço interior para a prática desportiva, pois o ginásio existente era pequeno e insuficiente para a quantidade de alunos inscritos.
Provavelmente, por questões de orçamento não foi possível construir um ginásio novo, pelo que a solução passou por dar uma cobertura ao espaço exterior, onde outrora já se situava o campo desportivo. Uma das intenções era, certamente, a de melhorar as condições desse espaço, protegendo os alunos da chuva.
Infelizmente, a concretização da ideia não se revelou eficaz, dado que a água continua a acumular-se no pavimento, ficando a sua utilização inviabilizada. Como resultado, os alunos continuam a praticar as aulas de educação física ao frio e, por vezes, à chuva (quando sequer são praticadas). E quando se assume que um dos objectivos da intervenção é tornar a obra mais funcional, penso que aspectos como este deviam ser revistos.




Julgo que o impacto desta intervenção junto dos flavienses foi significativo, independentemente da sua recepção ter sido boa ou má. O que pretendo salientar é o facto de sentir que a população, em geral, mostrou finalmente interesse em discutir a solução de uma obra contemporânea. Obviamente que isto também se deve à própria natureza da escola, pois foram muitas as pessoas (alunos, professora, auxiliares, etc.), de diferentes gerações, que frequentaram este espaço e que agora preservam uma memória do lugar.


Sem dúvida que a proposta de Nuno Brandão desafia o gosto que as pessoas cultivam pela arte, na maioria dos casos, ainda muito vinculado ao seu lado historicista e romântico. Quem prefere a grande plataforma da cobertura em vez do jardim ao estilo das “Freiras” (os flavienses sabem ao que me estou a referir)? Ou então, quem prefere o cinza escuro das paredes de betão, em vez do branco do reboco? Certamente, são poucas as pessoas que compreendem parte destas opções. Penso que apenas o tempo é que nos vai ensinar a entender certas tendências contemporâneas da arte, porque a criação de hoje é a história de amanhã.


Decido finalizar este artigo com uma ideia que o arquiteto Nuno Brandão me transmitiu durante as suas aulas e que, por alguma razão, continuo a reter na memória (será pelo carácter, simultaneamente, pedagógico e caricato da afirmação?): “O betão é o melhor amigo do homem a seguir ao cão!”



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