Viagens na minha Terra | A Linha do Corgo

Por: David Sarmento

Há quase vinte e seis anos que a via-férrea que fazia a ligação Chaves – Vila Real deixou de funcionar e o troço Vila Real – Peso da Régua há seis. A linha do Corgo era então, uma importante via de comunicação entre o Alto Tâmega e o Alto Douro Vinhateiro, hoje classificado como património da humanidade pela UNESCO.

Para as novas gerações como a minha, esta ligação ferroviária é uma história antiga e distante e foi neste sentido, com a promessa de uma pequena aventura, que peguei na bicicleta e me embrenhei por essa linha tantas vezes lembrada e que foi outrora dos nossos pais e avós.

Vou procurar não perder-me em descrições até porque prefiro deixar-vos com água na boca, no entanto, há certos pontos ao longo do caminho que merecem ser destacados, pela sua beleza, capacidade de reinvenção e ainda por aspectos menos bons da acção do tempo e do homem.

Comecei a viagem em Curalha, mais propriamente na ponte de pedra que liga as margens do Tâmega com um só arco. Se é bonito é para parar, é esta a regra que adoptei nas minhas viagens e esta nem tinha começado e já estava a sair da bicicleta. Partilhei este momento com uma mulher que vasculhava o chão à procura dos primeiros tortulhos entre os carvalhos.

De Curalha até Pedras Salgadas o caminho foi o que já temia, sem manutenção e interrompido ocasionalmente por estradas e apropriação indevida do terreno mas nada com expressão no todo e, na verdade, foi bastante fácil encontrar o fio à meada.

Ao entrar no concelho de Vila Pouca de Aguiar a história foi outra, uma boa surpresa. O caminho transformou-se numa ciclovia que foi bem recebida, a julgar pela afluência de pessoas a passear a pé, ciclistas matutinos e até rebanhos e seus respectivos pastores. É nos montes circundantes que nasce o rio Corgo que deu nome à antiga linha ferroviária transmontana. São quarenta e quatro quilómetros de extensão até encontrar o Douro e sítios bonitos não faltaram para o contemplar. Dali em diante, fui acompanhado pelo rio, pelo parque natural do Alvão à direita e pela serra da Falperra à minha esquerda.



A cidade de Vila Real apresentou-se pouco depois e percebi desde logo que a ferrovia, tal como em Chaves, foi engolida pelo meio urbano. Assim, fui forçado a atravessar a cidade até à velha estação para retomar o desafio. Pouco depois de deixar a cidade para trás, a paisagem alterou-se gradualmente dando lugar aos montes esculpidos do douro vinhateiro e o espaço cultivado tornou-se maior que o espaço baldio. A descida suave até à Régua teve assim o seu início na companhia de um Corgo belo e sinuoso. 

Para além da beleza indiscutível da paisagem, tenho que salientar também a opinião da gente com quem troquei meia dúzia de palavras durante as minhas pausas aleatórias. Em suma, falou-se de saudade e necessidade e todos sublinharam o bonito que era atravessar aquelas terras de comboio. Numa visão mais pessoal, senti que o potencial deste trajecto está pouco explorado e que provavelmente podia ser feito mais contando com a cooperação das várias partes responsáveis pela linha do Corgo.





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