Palavras Moucas, Ouvidos Loucos #7

Por: Diogo Martins Martins

O Progresso tem um número, vinte anos depois.


Existe em todos nós um desejo de segurança. Estabilidade. Um medo da desordem. Uma vontade tremenda de querer manter aquilo que achamos precioso ou demasiado importante para ser corrompido.

Asseguramos casas, telemóveis, carros. Asseguramos empregos, amores, planos e poupanças. Chegamos ao ponto de assegurar a única coisa que por definição é impossível de ser assegurada: a vida.


A música, que também no seu conceito pressupõe evolução e mudança, foi um acréscimo à lista de coisas que resolvemos assegurar por preconceito ou simplesmente por medo. Passamos na rádio o que é aceitável e na TV o que é bonito. Trocamos a ousadia pela conformidade. Esquecemo-nos que é com risco que se faz o progresso. É com coragem que se escreve a história.

Quatrada é portanto um tiro no pé. É o barro na parede. A pedra no charco e a bola no poste.

É tudo aquilo que esperávamos que fosse, mas completamente diferente.

Não é fácil. Não é querente. Nem é previsível. Não é um disco de singles em jeito de fast food para a rádio. Quatrada é a representação sonora da coragem, da ousadia e sobretudo do progresso.

Cada faixa deste álbum é uma força singular. Há as de contexto (“Balsagaita cun pandeiros”), as de passado (“Mirandum”), as que têm estórias (“Canedo”) e as referências (“Bebe Bino”).

Mas há também aquelas das quais é quase impossível não falar. É muito provável que, para cada um de vocês, este disco seja uma experiência diferente e por diferentes razões.

O primeiro destaque vai sem dúvida para “Tanta Pomba”. Não só pela colaboração de peso dos Clã, onde a voz de Manuela Azevedo é magistralmente incluída, mas também pelo facto de ser precedida por quatro faixas que resumem muitíssimo bem a densidade sonora da banda. Basicamente, são os Galandum a dizer “Isto é o que somos e aquilo que fazemos, agora tomem lá esta e esqueçam tudo o que sabem sobre nós”. Paragem obrigatória.




Depois, sem querer descuidar as faixas que ficam para trás, tem de haver uma referência óbvia à “Fonte do Salgueirinho”. É sem sombra de dúvidas a minha faixa preferida do álbum e a que faria o Mike Oldfield roer-se de inveja. É na minha opinião a faixa que mostra o desapertar do cinto de segurança. A que lança água sobre azeite quente e deixa tudo em fogo.

Crianças (ou seja, bandas em início de carreira), não tentem isto em casa. Pode mesmo correr mal se não souberem o que estão a fazer.
A partir daqui é uma viagem sem retorno e “Siga a Malta”. Zeca Medeiros, como só ele,
enfia-nos de novo em terreno minado. Uma faixa para escutar com atenção e que nos estremece com vozes impressionantemente registadas. As vozes e percussões neste disco estão a soar como nunca, e “Zé Pereira” é também uma prova disso. Também uma das minhas preferidas deste trabalho e que nos deixa a vontade de ouvi-lo todo de novo.

No final, o novo disco dos Galandum Galundaina não é uma viagem segura. E ainda bem.

Os Galandum são a prova de que é necessário ter um grande conhecimento e respeito pelo passado, para conseguirmos conseguir um futuro. Mostram-nos que a única maneira de nos tornarmos imunes à mudança do tempo, é mudando com ele.

Quatrada é isso mesmo. Aquele passo atrás e aquele salto em frente. Que muitos lhe sigam o exemplo.



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