Entre o Moderno e o Clássico: Álvaro Siza em Chaves #10

Por: Tânia Santos


Obra | Museu de Arte Contemporânea Nadir Afonso
Arquiteto | Álvaro Siza Vieira
Projeto | 2016


À custa do futebol, Portugal andou na boca de todo o mundo. Por cá, a grandeza da pequena nação motivou a exaltação do orgulho nacional e os portugueses saíram finalmente à rua para celebrar o talento dos seus.

O futebol é um meio de grande impacto, que comove rapidamente milhares de pessoas, mas felizmente as conquistas lusitanas não se restringem a este campo. Da parte da Arquitetura, Portugal recebe igualmente um contributo notável. Dois dos Pritzkers (prémio máximo da Arquitetura, a nível internacional) pertencem a arquitetos portugueses, Álvaro Siza e Eduardo Souto Moura, congratulados em 1992 e em 2011, respetivamente.

E é precisamente da mão do primeiro mestre que surge o projeto para o Museu de Arte Contemporânea Nadir Afonso. O próprio Nadir Afonso encarregou-se de convidar o arquiteto Álvaro Siza para desenhar a sua “casa artística” em Chaves. Porém, a concretização do projeto acontece já após o falecimento do pintor, que nunca chega a ver a obra construída. A cerimónia de inauguração do edifício ocorreu no passado dia 4 de Julho, contando com a presença do Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa.

Após uma primeira visita ao Museu, quando me foi pedido para fazer uma “avaliação” à obra, respondi de forma espontânea: “Esta é uma das melhores obras do Siza dos últimos anos”. Curiosamente, Souto Moura partilhou desta mesma opinião, explicando as suas razões no dia em que se juntou à mesa com Siza, no auditório do Museu Nadir Afonso, justamente para falar sobre a arquitetura do edifício, com o público local presente (e que bela lição de arquitetura com que os flavienses foram presenteados).

De certo modo, sinto que esta obra quebra um certo dogmatismo que o próprio Siza estabeleceu durante o seu longo percurso profissional (o emprego do termo “dogma” talvez seja exagerado, mas julgo que as grandes obras continuam a nascer das ideologias alimentadas pelos seus criadores).
Apesar desta rotura de pensamento, Siza continua a reforçar a sua atitude perante a arquitetura: ser moderno e clássico, em simultâneo.
O betão branco que reveste o exterior do edifício assinala a sua contemporaneidade, adaptando-se subtilmente à paisagem que a envolve: um edificado de sentido longitudinal que respeita a orientação da linha de água do Tâmega.
Por sua vez, o percurso pelo interior do Museu evoca a memória das salas barrocas do Classicismo: o reboco branco das paredes e coberturas complementa-se com a madeira do pavimento das salas e dos móveis; surge ainda a pedra para destacar elementos singulares (o mármore no balcão de receção, no embasamento de certas paredes e no pavimento do terraço da cafetaria).

Muitos outros aspetos haveria para destacar:

- O respeito pela preexistência, a partir da reconstrução dos muros de granito, exteriores, que limitam o terreno de intervenção;  
- O jogo geométrico apresentado nas paredes estruturais que sustentam todo o edifício, que por causa da natureza do terreno se encontra completamente elevado do solo. 
- A iluminação indireta na grande sala de exposição (para não danificar os quadros expostos pela incidência de luz solar) e da qual resulta uma claraboia intencionalmente sobredimensionada;
- Toda a poética presente no espaço do atelier que seria destinado a Nadir Afonso, o seu carácter de habitabilidade, a sua iluminação cuidadosa, a presença do pequeno púlpito para o pintor observar a sua obra de um ponto estratégico;



Em suma, estamos perante mais uma prova da maestria do arquiteto Álvaro Siza, cujo talento também merece o reconhecimento do povo português.

Para os flavienses que ainda duvidam da utilidade desta obra... porque a Câmara não tem dinheiro; porque a cidade não tem população suficiente; porque ninguém precisa de museus para sobreviver. Eu cá considero uma proeza a nossa “pequena” cidade conseguir reunir na mesma obra dois “grandes” artistas portugueses, Nadir na Pintura e Siza na Arquitetura. E todos aprendemos recentemente uma lição: o sentimento da nossa pequenez supera-se com grandes feitos!



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